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Você volta?

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Eu fiquei de falar pra você as novidades outro dia. Cê tá bem? Eu não. Quero dizer, estou ótima. Ontem mesmo eu sorri enquanto pensava na gente. Cê já sorriu pensando na gente? É. Somos engraçados. Você e o seu cabelo encorpado, meio crespo, meio liso, meio. Sei lá. Você olhando pela janela e perguntado se estou a fim de comer alguma coisa mais tarde. É que abriram um restaurante na esquina aqui de casa e dá pra ver aqui da janela. Cê percebeu? É de um amigo de um amigo do namorado de uma amiga minha. Falei enquanto esticava os meus pés no sofá. É que você tem esse jeito desprentecioso de me fazer sentir em casa dentro da minha própria casa. É como um ladrão que me rouba e pede desculpas por ter quebrado a alça da minha bolsa nova depois. Eu te acho fofo e você diz que já vai indo. Cê volta depois? Eu acho que sim, caso não for chover. Tá bom. Te levo na porta, porque quem leva na porta quer que a visita volte outra vez. Você precisa mesmo ir pra sua casa por esses anos? Você rir e diz que me adora. É bem doidinha, mas, adora. Beija a minha boca com esperança e fala que chega antes de o restaurante novo da esquina abrir.

Toda vez que você vai embora eu me sinto esquisita, é como se faltasse algo dentro do meu apartamento. Dai eu saio pra arejar as ideias e aproveito que já estou caminhando e passo no supermercado para comprar alguma coisa que acabou na geladeira. Mas eu não sei o que é. Eu compro leite, uma pizza congelada e chocolates. Quem sabe é falta de proteína, ou de fastfood ou de açúcar ou de você. Ou de mim. É isso. É de mim, a minha consciência grita. Eu pago o caixa e saiu correndo. Moça eu preciso resolver uma coisa urgente e nem precisa empacotar. Jogo tudo na bolça que você quebrou a alça e corro de volta pra casa. Será que você vem?

Você disse alguma coisa sobre o restaurante do amigo de um amigo do namorado da minha amiga. É isso. Eu preciso revirar o guarda-roupa pra ver se encontro algo que me caia bem. Eu vou de preto porque é a cor do mistério e eu quero muito que você me veja diferente dos outros dias essa noite. E eu odeio tanto o meu corpo por não ser tão proporcionalmente distribuído que, ó. Às vezes desisto de ir a algum lugar porque não sou bela. Não tenho cara de mulherão e não sou fofa e não sou misteriosa e não sou desejável. Eu sou doidinha como você sempre diz. Achei que fosse um elogio. Eu odeio todas as mulheres que tem corpo bonito e mais uma penca que tem cabelos brilhantes e cílios gigantes. É tarde pra ir chorar no banho após ter tomado um banho de duas mil horas pensando no que iria usar pra sair com alguém e agora nem saber por que mesmo quer ficar toda bonita pra ir ali à esquina? Poxa. Porque tão perto, restaurante. Seria tão melhor se fosse do outro lado da cidade e você chegasse todo cheiroso com o seu cabelo bem penteado e dissesse que toma um whisky enquanto me espera decidir a cor do sapato que vou usar. E depois dizer que não entende porque as mulheres gostam tanto de sapatos de salto, afinal, eles machucam tanto não é mesmo? A gente fica toda torta querendo fazer ar de Diva enquanto o dedinho pede socorro e a mesa mais próxima pra poder relaxar. Meia hora escovando os cabelos e depois faz cachos e depois bagunças os cachos com os dedos pra parecer que não fez nada de especial e que já nasceu assim. Mamãe e papai que fez. Porque as mulheres enganam tanto a si mesmas, hein? Daí eu sairia do quarto com um vestido novinho em folha, de batom vermelho, saltão e cílios de duzentas camadas de rímel e te ouvir cantar um “Uaul, eu retiro tudo que disse sobre as mulheres”… E eu poderia sair de casa toda poderosa com uma bolsa que cabe na palma da mão e a autoestima lá na torre do prédio. Você abriria a porta do carro e os nossos perfumes diferentes se misturariam formando o ambiente perfeito pra gente esquecer-se do restaurante e me desarmar toda ali mesmo na garagem. Mas não…

Eu não consigo decidi o que visto pra ir te ver e me sinto vazia. Uma saudade de mim que não sentia essa saudade de você. Uma saudade de mim que esqueceria tudo e se atiraria no sofá portando minha pizza congelada e mais uma temporada de Sex and the City. Uma saudade de mim que não precisava sentir fome sem estar com fome só porque você estar com fome e quer comer numa droga de restaurante que você nem sabe se a comida é boa.

Você manda uma mensagem via whatsapp perguntando se estou pronta e eu esqueço a melancolia, paro de fazer drama, engulo o choro, visto uma roupa sem noção com uma sapatilha que não combina, solto o cabelo, passo duas camadas de rímel, não uso batom vermelho que é pra não te deixar com boca de palhaço em público, borrifo perfume de longe e me olho no espelho. Nem foi tão difícil assim, não é?

A campainha toca e eu fico orgulhosa de mim por ter feito você voltar tão cedo. Abro a porta com um sorriso de orelha e você entra com duas caixas de pizza, refrigerantes e um “eu acho melhor a gente comer por aqui e se amar por aqui mesmo, a gente nem sabe se a comida daquele restaurante é boa e você está tão cheirosa”. Eu não sei se te odeio por ter me feito ficar louca há algumas horas atrás por perceber que não tenho roupa, nem beleza e nem um lugar melhor pra ir ou se te amo por ter me salvo de sair por aí com essa blusa que não combina com esta sapatilha e sem batom vermelho. E eu nem sei se é amor. A quem mesmo eu estou querendo enganar? Eu sei que não é ódio. Tem filme novo no netflix. Você balança a cabeça e me beija e rir porque pela primeira vez na vida eu não te deixo com a cara toda lambuzada de batom vermelho. Qual era mesmo a novidade? Eu sou mesmo doidinha, mas, você também é. Eu sei.

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